Logística não é uma expressão nova. Desde os romanos, passando por Napoleão Bonaparte, sua boa aplicação é o diferencial entre guerreiros vencedores e vencidos. No mundo sem fronteiras de hoje, a competitividade é o combustível que alimenta um novo tipo de guerra: a luta pelo cliente, o grande troféu da economia de mercado.
Em grande parte das organizações e mesmo da opinião pública persistem estereótipos associando logística exclusivamente à transporte e, às vezes, à armazenagem. Nas instituições de ponta o conceito é muito mais amplo e revolucionário. De forma simplificada, podemos afirmar que a logística está relacionada a todo recurso, tangível ou não, que agregue valor de lugar e de tempo a processos operacionais diversos. Essa concepção exige o emprego de trocas compensatórias (trade-off), para que tais valores sejam maximizados e transferidos para o cliente. Valor de lugar é gerado pelo transporte, enquanto o de tempo pela disponibilidade de materiais e de serviços. Dirá o leitor: rodeou e chegou a transporte e armazenagem, antes descrita como visão míope. A questão é um pouco mais complexa, pois está associada a outros conceitos que se completam: o da cadeia de valor, proposta por Porter nos anos 80, e um pouco adiante, ao da cadeia de suprimentos, ferramenta gerada pela percepção de que o cliente é o único detentor da moeda positiva que alavanca os negócios à montante do consumo final. Parece complicado ou pretensioso, mas nem tanto.
Expliquemos com um exemplo do cotidiano: o pão nosso de cada dia. Aparentemente, esse produto sagrado na família brasileira, resulta da ação do padeiro ao misturar farinha de trigo, sal, fermento, água, e levar ao forno para o nosso deleite. Acreditem, esse produto, tão simples, é resultante de complexas operações (e custos) anteriores - o tal montante da cadeia, a partir do moinho que compra o grão de trigo e o transforma em farinha, utilizando equipamentos e serviços. O produto final é embalado e transportado para as padarias. Antes do moinho temos o campo produtor, se nacional, consumindo sementes, adubo, espaço, combustíveis, equipamentos e implementos, além da estocagem dos grãos em silos e do transporte para os moinhos. Se o trigo for importado, e grande parte o é, há, também, o transporte marítimo e todas as operações de desembarque e desembaraço aduaneiro, além do transporte para o moinho. Todas essas operações consomem tempo e custos. Nessa viagem rio acima, outras cadeias cruzam o caminho, como as do aço, do alumínio, da energia, do vidro e muitas outras que contribuem para o plantio, crescimento, colheita do trigo e produção do pão. São, portanto, centenas ou milhares de atores que contribuem para que o nosso simples pão francês esteja em nossas mesas, a cada dia. E daí, perguntarão os céticos? Daí que, se a cadeia puder ser gerida de tal modo que a transferência de valores entre os principais elos se faça com menores custos, o resultado será a maior satisfação do cliente, maior competitividade do produto e, certamente, maiores vendas e geração de empregos. Sob o ponto de vista conceitual, as cadeias são semelhantes, sejam as de produtos simples como o do nosso exemplo, como, também, de produtos sofisticados, como automóveis, computadores, aviões e outros.
A gestão das cadeias de suprimentos, feita por pessoas, bom não esquecermos, tornou-se o grande desafio empresarial dos anos 90, tanto no mundo desenvolvido como em países emergentes como o Brasil. A inflação, o isolamento comercial e a inexistência de uma moeda-referência contribuíram para que somente depois do Plano Real, a partir de 1994, pudéssemos acompanhar o desenvolvimento dessa nova forma de fazer logística. O caminho pela frente ainda é longo e cheio de gargalos, mas, parafraseando Gil, o ministro, o Brasil há de nos dar régua e compasso para chegarmos lá. Isso já é uma outra história, relacionada a um grande problema nacional que é o da carência de uma infra-estrutura logística, personagem indispensável para que possamos produzir, exibir e sustentar o espetáculo do crescimento, como deseja o Presidente Lula.
Renaud Barbosa da Silva, renaud@fgv.br
Professor de Logística da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas
Fundação Getulio Vargas
Um comentário:
Muito bem! (:
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